The devil is in the lock-in


by Rafael Rosa

Salve,

Meu último post gerou algum barulho, como todo post sobre assuntos polêmicos, e comentário do Akita foi (como sempre) muito bacana, e merece uma resposta akitada (para quem não sabe, akitar é um verbo que indica a escrita de um post gigante, como o próprio Luca comentou).

Como já falei para ele numa mesa de bar, quase vendi meu Wii por culpa do Akita, só não fiz isso porque ele é da minha esposa :) Até aquele dia, nunca havia encarado video-games como computadores, mas ele tem razão, são plataformas fechadas, aliás, muito fechadas, onde você só pode rodar o programa vendido pela empresa que criou o console e há pouquíssima compatibilidade com outros consoles, e quando há se limita a acessórios (guitarras do Guitar Hero, por exemplo).

Particularmente, não me importo com o free software puro ou o fato das coisas serem grátis, acho justo pagar pelas coisas, afinal, todo mundo tem que pagar as contas. Não uso Ubuntu só porque é grátis, pagaria com prazer, mas pra mim ela tem mais valor porque é um sistema feito pela boa vontade/necessidade/desejo/egoísmo de milhares de pessoas ao redor do mundo e mais um monte de grana da Canonical, que tem lucro com ele, ainda que de forma indireta, mas continua sendo uma forma de ganhar a vida, de um jeito que nem toda empresa quer, e não precisa querer. Escolhas são boas nesse contexto.

Sobre a questão do SaaS loophole, particularmente acho isso um pouco exagerado, na linha maluca do Stallman, que é um extremista no assunto, apesar de eu acreditar que ele peca por tentar fazer algo bom, mas isso é outro assunto. Usar ou fazer free software ou open source é uma escolha de cada desenvolvedor/empresa, e apesar de eu gostar da filosofia por trás deles, entendo empresas que cobram pelo seu trabalho, é algo justo, o que me incomoda é o maldito vendor lock-in.

Um Google Docs da vida pode não me deixar mudar a plataforma, mas eu posso simplesmente mudar de programa ou não usar, sou livre para deixar o lugar e ainda por cima permitem que eu utilize padrões abertos com ele, o que diminui minha barreira de saída. Considerando que é uma plataforma hosted e eles não me cobram um centavo para usar o serviço, porque diabos vou reclamar? Além disso, o Google, apesar de estar longe da perfeição, contribui com open source e tem iniciativas como a Data Liberation Front, uma iniciativa para facilitar a exportação e importação de dados de aplicativos do Google. Eles publicaram um artigo interessante sobre o que significa ser open para o Google, vale a leitura (aproveitem e assistam o filme Rashomon do Akira Kurosawa, muito bacana)

Agora, vejamos o Windows, plataforma com a qual trabalhei durante mais de 10 anos: custa caro, usa meus recursos (leia-se, não é hosted) e ainda por cima me obriga a trocar de máquina sempre que atualiza a versão, é pouco compatível com padrões abertos (vide IE e documentos do Office) e ainda por cima só roda coisas feitas especificamente para ele, quase nada funciona em outras plataformas sem muito esforço. Ou seja, um lock-in absurdo, a barreira de saída é muito alta, ainda que eles venham melhorando nos últimos anos. Outro dia mesmo eles mudaram a licença das linguagens Iron para Apache 2.0, e me disseram que o IE 9 está ficando show, com um excelente suporte para CSS 3 e coisas do tipo, o que é um avanço incrível.

Do Mac OS em si eu nem reclamo muito, porque ainda roda várias coisas *nix e tem um preço bastante baixo, mas sofre de alguns males do Windows. Já o iOS com suas várias limitações eu não engulo, mas o problema não é tanto o sistema operacional, e sim as barreiras da Apple com seu App Store, iTunes, DRMs e limitações de linguagens.

Os DRMs são um porre e muito utilizados, como por exemplo no Kindle, mas é a única forma de se obter livros em formato digital sem piratear nada, o que é justo dado o trabalho absurdo que dá escrever e publicar um livro, apesar de achar absurdo cobrarem a mesma coisa por um livro impresso e um livro digital. Felizmente existem algumas opções como a O’Reilly, a Apress e a Pragmatic Programmers, que publicam seus livros sem DRM e de vez em quando permitem que alguns dos seus livros sejam publicados como Creative Commons, como o Pro Git, o Ruby Best Practices, o CouchDB - The Definitive Guide e mais recentemente o Rails 3 in a Nutshell. A própria Apple parou de usar DRM nas músicas do iTunes Store, mas continua com DRM nos vídeos e segundo eles o problema é com as gravadoras. Quanto aos livros, parece que alguns tem DRM e outros não, como uma das FAQs da própria Apple dá a entender, e eles não estão apoiando um novo sistema de travamento chamado UltraViolet. Ou seja, nesse quesito estão indo no caminho certo, pelo menos é o que tudo indica.

As limitações de linguagem são estúpidas, e provavelmente irão cair cedo ou tarde, mas o App Store já é mais complicado, porque faz parte da estratégia global da empresa, e é uma das grandes razões do lock-in. O “just works” tem um preço bastante alto, exigindo uma integração completa da solução. Se um dia eles mudarem, ficarei mais feliz, até porque eles já fazem outras coisas legais, como colaborar para o open source e também serem ecologicamente corretos, e bem que podiam arrumar aquele lance da Foxconn, que está bem ruim.

No fim, o lock-in é o meu grande vilão. Poder escolher entre ficar ou não na plataforma ou na ferramenta é uma questão muito importante para mim, e no limite, a única forma de não ser pego por ele é não comprando o produto ou serviço com alto grau de lock-in ou de uma empresa que utilize dessa prática, e é exatamente isso que faço no caso da Apple e da Microsoft.